Hermenêutica Jurídica: aula do dia 26 de maio de 2009
Na aula de Hermenêutica Jurídica do dia 26 de maio de 2009, na Universidade Potiguar, o professor Francisco Honório de Medeiros Filho fez uma revisão sobre a chamada subsunção apresentada na última aula e aprofundou o estudo quanto a interpretação da norma jurídica. Todo o conteúdo dessa lição foi organizado, redigido e segue disponibilizado neste tópico.
Inicialmente, recomenda-se para quem quiser se aprofundar nos conteúdos ministrados na disciplina de Hermenêutica Jurídica a leitura do livro O Positivismo Jurídico: Lições de Filosofia do Direito, de Norberto Bobbio.
Entre as atividades do operador do direito temos a produção da norma jurídica, assunto que não analisaremos em Hermenêutica Jurídica; a interpretação da norma jurídica, a ser estudada hoje; e a aplicação da norma jurídica, vista na aula passada.
Da maneira que pudemos ver, aprendemos que a aplicação da norma jurídica diz respeito ao fenômeno da subsunção. E como seria esse fenômeno?
Resposta de aluno: Seria a aplicação da norma ao fato.
Não é propriamente a aplicação da norma ao fato. Pegaremos um fato específico, veremos se ele está desenhado na norma e em estando aplicaremos nele o que a norma estabelecer. Subsumir significa desaparecer o fato dentro da norma; fazê-lo estar embaixo do “guarda-chuva” que é a norma jurídica, quando sabemos que ele é um fato jurídico e não outro qualquer. Na subsunção, o fato é encampado pela norma jurídica.
Na visão que fazemos da norma jurídica dizemos que ela é a hipótese fática mais a consequência, então no momento em que algo do mundo exterior toca o ordenamento jurídico, ele só é recebido pelo ordenamento se este o prevê. Caso não haja previsão, “ele bate no ordenamento e volta”. A hipótese fática é o fato previsto pela norma. A consequência é a concretização do que a norma prevê. Por exemplo, hipótese fática: realizar assessoria de lazer. Consequência: Pagar ISS (Imposto sobre Serviços). Isso é o que chamamos de norma jurídica 1. Na norma jurídica 2, temos o fato e a sanção imposta pelo descumprimento. Por exemplo, “avançar o sinal vermelho do semáforo ou o de parada obrigatória” (artigo 208 do CTB). A consequência, no caso, confunde-se com a sanção: multa.
Pergunta de aluna: Todo fato está previsto no ordenamento?
Não. Suponhamos a invasão do planeta Terra pelos marcianos. É um fato que não está previsto.
Comentário de aluna: Então está permitido!
Claro, mas esse é um tensionamento tão forte que o sistema desaparece.
Pergunta de aluna: Em que se diferencia a interpretação e a aplicação?
A aplicação é o resultado da interpretação. Temos o operador do direito; o fato e a norma jurídica no campo da interpretação; e a consequência no campo da aplicação. Escreve-se o fato antes da norma por uma questão puramente pedagógica, porque o sistema funciona dessa forma. Em um processo primeiro explicita-se o fato, fundamenta-se juridicamente (justificativa para enquadrar o fato na norma) e ao final define-se. Porém, na realidade, por exemplo, quando um “amarelinho” vai lavrar um auto de infração já sabe tudo do ponto de vista jurídico em relação ao fato.
No sistema, realmente, no momento em que aplicamos a norma estamos interpretando. Isso está definido em lei. É uma questão de natureza processual. O direito chama de aplicação o momento no qual o pensamento, que resultou da interpretação, será concretizado na sentença. Somos obrigados a obedecer à lógica imposta pelo próprio ordenamento. Vejamos que um processo termina na sentença do juiz, mas até chegarmos a ela existe uma sequência de acontecimentos de natureza jurídica, o que chamamos de prosseguimento, sendo este um processo de conhecimento.
A interpretação da norma jurídica, segundo Bobbio, é para o juspositivismo declarativa/reprodutiva, enquanto que para seus adversários é criativa (realismo jurídico). Isso significa que para o juspositivismo (não todos, pois há vários) toda interpretação deve ser declarativa/reprodutiva, não podendo ser criativa, pois assim sendo, obviamente, está-se indo contra o ordenamento jurídico. Ela tem que declarar/reproduzir o conteúdo da norma. Pensemos, por exemplo, numa música da banda Calcinha Preta – sem julgamento de valor -. Se chamarmos 25 músicos de vários gêneros musicais para tocar “Você não vale nada mais eu gosto de você”, cada um numa versão diferente, mas respeitando a sequência de notas que caracterizam essa música, teremos interpretações declarativas/reprodutivas. Caso algum músico altere uma nota característica da canção, a interpretação passa a ser criativa. Quando falamos em declarar/reproduzir referimo-nos a estender o conteúdo da norma às situações nela previstas. Se ocorrer alguma situação, cuja norma devesse ser aplicada e não o é, está havendo criação.
Exemplo 1: Na visão juspositivista, se a Constituição Federal dá direito ao servidor público de entrar em greve, mas ela própria diz que este direito precisa de regulamentação, o servidor público não pode usar do exercício da greve, pois essa norma não foi regulamentada.
Exemplo 2: Seguindo uma visão criativa, o Poder Judiciário disse que “a greve para o servidor público obedecerá aos mesmos critérios da Lei 7.783/89, que regulamenta o exercício da greve de trabalhadores do setor privado”.
Pergunta de aluna: E essa norma criativa é válida?
Não. Ocorre um tensionamento do sistema. Em outras palavras, “manda quem pode, obedece quem tem juízo”.